sábado, 3 de julho de 2010

ANALISE: SINGULARITY PC PS3 XBOX360



A Raven Software não é uma companhia sem experiência em FPS. Embora seu nome ultimamente tenha sido associado a jogos de ação da Marvel (X-Men Origins: Wolverine, Marvel: Ultimate Alliance, etc.), a empresa foi responsável pela produção de vários jogos de tiro em primeira pessoa. Quake IV e a série Soldier of Fortune estão em seu portfólio, mas sua experiência no gênero vem dos anos 90, tendo ela produzido HeXen e seu sucessor espiritual, Heretic. E a companhia, depois de concluir o recente Wolfenstein, decidiu voltar com mais uma aposta para o gênero, um jogo que dessa forma não faz ao seu título, mas consegue dar uma refrescada nessa tão visitada categoria.

Singularity quer dizer "singularidade", "particular", uma característica que só pertence a este alguém, uma "peculiaridade". É curioso, pois o título quase nada tem de particular. Ele é uma autêntica sopa Lavoisier, pegando emprestado dezenas de ideias vistas em jogos de sucesso recente e até na TV. Mas o importante, e cremos que vocês vão concordar, é que as peças se encaixam, a fórmula funciona, e o jogo acaba entretendo de formas distintas, e é isso que realmente nos interessa.

Para começar, a trama é bastante curiosa. Depois de um satélite descobrir atividades radioativas em uma ilha russa isolada, você, na pele de um soldado de uma força-tarefa, é enviado para descobrir o que se passa no local. Embora as informações dão conta de que não há vida, você, obviamente, vai descobrir da pior maneira o quão erradas estavam as leituras. Os dois helicópteros enviados são atingidos por uma descarga, e apenas você e mais um acabam sobrevivendo à queda.

O jogo se passa na ilha de Katorga-12, um local onde, após a Segunda Guerra Mundial, se tornou palco de experimentos científicos com um recente metal descoberto, parecido, porém muito mais poderoso que o plutônio. O intuito de Stalin, então governante da U.R.S.S., era de usar o E-99 (elemento 99) para fortalecer seu poderio militar, e enfrentar a ameaça americana. No entanto, uma grande explosão na Singularity, a torre principal, acabou matando quase todos que viviam na ilha, civis ou não, e muitos dos sobreviventes acabaram virando criaturas mutantes batizadas Zeks.

Pode-se dizer que Singularity possui etapas distintas. Na primeira parte, quando estamos conhecendo o ambiente e estamos desarmados, o jogo se mostra um survival horror, usando e abusando de sustos gratuitos, a maioria absoluta ligada a sons como sussurros, crianças jogando bola, objetos se quebrando do nada. Até que os Zeks apareçam realmente, serão muitos minutos de pura tensão. E mesmo depois de achar sua primeira pistola e conhecer essas criaturas horrendas, ainda ocorrerão muitos momentos de certo pânico.

Uma das principais descobertas sobre o E-99 é a possibilidade de se manipular o tempo. Por isso, em vários momentos, acontecerão flashbacks e o jogador assistirá a eventos que ocorrem na ilha há quase 60 anos, efeito colateral da explosão que devastou o local no passado. Um dos pontos chaves da trama é que em certos momentos e locais específicos, o jogador fará viagens no tempo, para a época em que o centro de pesquisas era funcional, e alguns atos aparentemente pequenos vão alterar o rumo da história. Logo no início do jogo, por exemplo, ao salvar um cientista que seria morto durante a explosão no laboratório, a história muda e o jogador, ao voltar para o presente, se depara com um fato inusitado: Demitrev, o homem salvo, se torna um tirano que dominou o mundo. Daqui para frente, caberá ao jogador desfazer isso. A trama é bem amarrada aos eventos do jogo, e tem lá seus agrados. Mas, ela merecia mais desdobramentos, visto que temos um conceito que dá margem para muitas variantes. Infelizmente o que temos é uma história totalmente linear, com o jogador sendo obrigado a seguir todos eventos na ordem que lhe são apresentados. Ao menos a narrativa é bacana e lembra um pouco o saudoso Half-Life 2, com NPCs (um cientista e uma garota mais nova que você) ajudando seu personagem a enfrentar os inimigos, aparecendo em vários pontos e oferecendo coordenadas para as próximas tarefas.

As criaturas em Singularity são zumbis mutantes que nada tem de bobos. Eles atacam ferozmente e rapidamente, usando movimentos na vertical e horizontal que os fazem sair facilmente da mira. Alguns deles possuem, inclusive, poderes temporais, sendo capazes de sumir e aparecer em outro ponto (como o Noturno dos X-Men) em uma fração de segundo - geralmente atrás de seu personagem, para seu completo desespero. Há outro tipo de criatura que é ainda mais forte, porém não enxerga, que só ataca se seu personagem fizer algum barulho. Coincidência ou não, nessa parte estávamos praticamente sem munição, e tivemos que "dançar conforme a música" e andar de fininho - realmente uma tensão só, principalmente por conta seus constantes grunhidos gratuitos. Há também inimigos menores, tipo insetos mutantes, e chefões. Há um número bom de chefões, incluindo um ser abissal que vez por outra aparece e causa algumas desgraças.

Para enfrentar esses seres, o jogador terá um arsenal limitado, porém potente contra as criaturas. O jogador começa com uma faca e, após aquele período de miséria, recebe uma pistola, a Centurion. Depois disso e em sequência, chegam duas armas: uma espingarda e um fuzil. O que essas armas têm de particular é que elas usam projéteis de E-99, a única coisa capaz de acabar com essas criaturas. Quando o jogador utilizar o rifle, terá uma habilidade que existe em outros jogos, mas que aqui possui uma explicação científica: "slow motion". Uma das últimas armas atira um projétil que explode ao impacto, mas é muito lento. É possível comprar munição e upgrades para as armas (usando itens encontrados no jogo) em máquinas específicas espalhadas pelo jogo.

Mas, o que Singularity tem de mais interessante, é o TMD (Time Manipulation Device), que garante habilidades relacionadas à manipulação do tempo, que fazem toda a diferença no jogo. Um disparo contra um adversário humano, por exemplo, e é possível fazê-lo envelhecer instantaneamente e vê-lo "voltar ao pó", literalmente. Mais para frente, será possível até mesmo converter um ser humano em um Zek, fazendo-o atacar os humanos próximos. Contra Zeks, os efeitos são variados. Alguns deles ficam incontroláveis, como os insetos, e atacam uns aos outros. Às vezes, o único efeito é deixá-los paralisados no tempo. Usar o TMD sempre que possível é crucial para economizar munição, que pode ficar escassa em alguns momentos mesmo no modo normal. Mais importante, esse tipo de variação é importante para dar uma renovada na gameplay.

Com o tempo, o TMD receberá upgrades e assim novas habilidades virão à tona. Em determinada parte será possível usar uma esfera azul que, ao ser jogada no chão, se expande e paralisa tudo o que estiver em seu campo, incluindo inimigos, que podem ser alvejados à vontade (igual à habilidade de Clank em R&C Future: A Crack in Time). Há também um disparo tipo uma onda que atordoa tudo que atinge. Mas, isso não é tudo; esse dispositivo tem outras funções dentro do jogo.

Sua habilidade de envelhecer e renovar funciona com objetos e é possível usá-la, por exemplo, para enferrujar ou demolir a cobertura usada por inimigos, usando a degradação natural pelo tempo. Ou restaurar as mesmas proteções e usá-las ao seu favor. Mais que isso: há puzzles envolvendo o envelhecimento de certas caixas metálicas que ficam menores, o que permite passar por frestas antes impossíveis. Aliás, isso faz uso de mais uma habilidade, outra herança de Half-Life 2: a telecinese. É possível erguer e atrair vários tipos de objetos, e arremessá-los ou simplesmente largá-los. Mover caixas para servir de apoio ou renová-las embaixo de uma porta para fazer aparecer uma passagem são algumas ações possíveis durante o jogo.

Sem dúvida Singularity tem suas qualidades e defeitos, e felizmente a parte não é seu ponto fraco. Embora não seja uma referência para essa geração, o jogo está bem acima da média, com um cenário bem concebido, crível e iluminado, criaturas grotescas e efeitos de chuva bacanas, animação suave, enfim, a produção teve o seu esmero. E são bem variados, indo de instalações diferentes (escolas, laboratórios, depósitos) a cavernas repletas de uma estranha ambientação tipo "alienígena". Nossa única reclamação fica por conta de algumas situações inusitadas onde NPCs ficam repetindo seus movimentos enquanto o jogador não faz o que deve ser feito (poucas vezes) e a iluminação/coloração dos objetos interativos, que ficam bastante destacados do resto do cenário. Ainda por cima, o game tem um sistema de dano localizado, herança de Soldier of Fortune, da própria Raven. Atirar nos braços e na cabeça dos inimigos causa estragos distintos como desmembramentos e decapitação.

O ponto forte mesmo da ambientação está nos efeitos sonoros. Singularity praticamente "apela" com sons apavorantes vindos de todos os lados, mesmo quando não há nada na tela para gerar isso. São grunhidos vindo da esquerda, gritos da direita, sons do teleporte do Zek de todos os lados. E quando pensamos 'Bah, não tem nada aq...!' é quando vem a surpresa, seguida de um ataque. O clima é tão tenso que até mesmo simples trovões sempre nos pregam uma peça.

Singularity é particular até mesmo em seus defeitos. Além de alguns pequenos pormenores de colisão (um health pack desapareceu dentro da parede uma vez) e dos objetos interativos destacados, há uma estranha escolha de design. É possível interagir com muitos tipos de objeto como telefones velhos e máquinas de escrever, mas só para ouvirmos sons característicos desses aparelhos. Era melhor terem ignorado isso do que terem o trabalho de espalhar esses inúteis objetos pelo cenário.

A campanha do jogo pode durar até dez horas, mas os três finais disponíveis não carecem da necessidade de se completar a história três vezes. Basta recomeçar de um save game bem próximo ao final, seguir um dos três caminhos distintos, e em apenas mais alguns minutos todos os segredos serão revelados. A longevidade do título poderia ser garantida em um multiplayer bem trabalhado, mas novamente a produtora se acomodou, oferecendo um componente pra lá de limitado, com apenas dois modos de jogo.

Uma das modalidades é um autêntico team deathmatch, onde um time de soldados humanos enfrenta outro de criaturas. Já o segundo traz o singular objetivo de domínio de localidades, no melhor estilo capture the flag. Talvez o maior barato do componente seja usar as criaturas e suas armas distintas, como as terríveis aranhas mutantes. E entre os poderes específicos dos clãs podemos citar teleporte, cura, escudos temporários e controle dos soldados inimigos (apenas mutantes), e tudo isso usado em conjunto causam efeitos até empolgantes nos combates. E juntamente por conta de tantas possibilidades que acabamos sentindo falta de mais opções de modo.

Singularity não é uma obra de arte para o gênero de FPS, mas traz muitas ideias legais, juntamente como uma penca de outras pegas emprestadas de jogos como Half-Life 2, TimeShift, Ratchet & Clank, entre outros. É um FPS com uma trama empolgante envolvendo volta no tempo, mas que não é muito desenvolvida, e acaba deixando a desejar por não oferecer ao jogador a chance de moldar um pouco a história. Seu maior defeito é sua total linearidade, enquanto os poderes ligados a TMD e à manipulação do tempo são seus pontos fortes. Uma modalidade mutiplayer com mais opções teria ajudado a aumentar a longevidade, já que a campanha dura 10 horas e os três finais diferentes não são incentivo que valorizem um reinício de jornada. Talvez valha para aquele aluguel de fim de semana, mas não muito além disso.

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