sexta-feira, 26 de março de 2010

ANALISE: RAGNAROK DS



RPGs tradicionais e RPGs online podem compartilhar da mesma idéia básica, mas não há como confundir a estrutura ou execução de um e outro. Enquanto um se foca na história, que tem começo, meio e fim, o outro se foca no próprio jogador, que mostra na rede algo mais autoral, de sua autoria, que são suas conquistas em um mundo persistente e habitado por milhares de outros jogadores. Com características tão diferentes, não é de se espantar a dificuldade de unir os dois universos em algo comum. Mas há quem tente.

E eis que a coreana GungHo decidiu justamente fazer uma tentativa no que diz respeito a unir mundos tão diferentes e distintos. O resultado foi Ragnarok DS, uma versão ''offline'' do massivo multiplayer online criado pela Gravity Corporation. O título tira proveito de todo o conteúdo presente na versão online, incluindo as cidades, classes de personagem, adversários e até mesmo algumas mecânicas mais básicas como a distribuição de pontos de atributo e habilidades mais básicas.

Antes de qualquer coisa, é preciso deixar claro que, apesar de aproveitar tudo isso de um game online, "Ragnarok DS" é um título offline e seu desenvolvimento é totalmente baseado nesta realidade. Você pode sim criar o seu personagem, escolher sua classe, distribuir seus pontos de atributos da maneira que achar mais justo e prosseguir com a resolução de inúmeras quests e diferentes buscas. O problema é que, com tantas diferenças entre um e outro mundo, o resultado acabou por deixando a desejar em alguns momentos, onde o que funciona para um acaba não se adaptando bem para outro.

Podemos definir a maior parte dos problemas do game em uma só palavra: grinding. O termo pode não ser de conhecimento geral, mas certamente faz bastante sentido para os jogadores de games online no estilo RPG. Ele é usado para definir uma ação que é repetida à exaustão, possibilitando assim que o jogador avance em seu desenvolvimento e, na maior parte do tempo, acaba desencadeando mais uma sessão de repetições semelhantes até que sua cabeça exploda se seu cérebro fique espalhado por todo o local. Nojento.

Querem um exemplo prático de grinding? Pois imaginemos que um NPC dê a seguinte quest: Precisamos construir esta ponte para que então você possa avançar para a próxima cidade, dando assim continuidade à sua história. Para que isso seja necessário, você precisará trazer para mim 15 jujubas, 20 peças de carne seca e 30 ovos cozidos. Diante de tal pedido você simplesmente vai atrás dos adversários que costumam deixar tais itens para trás, recolhe a quantidade necessária e volta par o NPC que lhe passou a fatídica tarefa.

Isso é até aceitável em um massivo multiplayer, já que a progressão do jogo é intimamente atrelada ao desenvolvimento do seu personagem e a aquisição de novos itens. Mas como isso fica em um RPG tradicional? Extremamente cansativo talvez seja a expressão que melhor se encaixa neste caso. Infelizmente "Ragnarok DS" pega todos os elementos do original online, inclusive estas partes ruins. A história é bacaninha, apesar de boba, e os personagens possuem um mínimo de carisma. Mas a jogabilidade não apresenta grandes variações ao longo do tempo, além de ser extremamente repetitiva, conforme exemplificamos anteriormente.

Nem mesmo o sistema de classes ajuda o game neste aspecto. Dado como uma das coisas mais interessantes no título, ele permite que você escolha diferentes profissões para o seu personagem, cada uma com habilidades e características bastante específicas. Com o tempo as próprias profissões evoluem, dando a oportunidade ao jogador de se tornar algo ainda mais poderoso, mantendo suas características anteriores e ganhando habilidades realmente relevantes para sua aventura. O problema é que estamos falando de um game que possui começo, início e fim, e diferente de sua versão online, não oferece muitas opções para quem quer jogar mais de uma vez. Fica então em cheque a capacidade do título de oferecer conteúdo suficiente que se sustente através de mais de uma tentativa.

Talvez a forma mais justa de oferecer esta sobrevida seria por meio de seu modo multiplayer. Afinal, estamos falando de um game cujas raízes estão focadas na interação entre centenas de usuários em um universo persistente. Infelizmente o título deixa muito a desejar neste aspecto. Em primeiro lugar, não é possível participar de partidas multiplayer logo no início. Primeiro é necessário chegar até a Mirage Tower, local especial que permite aos jogadores se conectarem a outros portáteis em rede, formando assim grupos de até três participantes. O problema é o que fazer depois disso. A única coisa disponíveis nestas partidas multiplayer é o ingresso em dungeons exclusivas para este modo. Lá você pode enfrentar poderosos adversários, muitas vezes derrotados somente com a ajuda de amigos.

O problema é que isso acaba se tornando banal em pouquíssimo tempo, principalmente por não guardar nada de especial. As recompensas são limitadas aos itens deixados pelos monstros, que por sinal podem ser adquiridos normalmente durante a missão principal. Levando isso em conta, fica a pergunta: qual a vantagem destas partidas multiplayer, a não ser a interação com outros jogadores? Nenhuma. Tudo o que você adquire ali pode ser obtido ao longo da história, muitas vezes de maneira até mais fácil. Isso coloca em cheque a necessidade de tais partidas, tal como a inspiração do jogador de participar das mesmas.

Graficamente o título ainda deixa um pouco a desejar, mais pelas limitações do Nintendo DS do que do conteúdo propriamente dito. Dizemos isso porque muito do material aqui presente é basicamente o mesmo do conteúdo online, só que em resolução um pouco inferior. Os personagens e adversários são representados por sprites, isto é, imagens em 2D que mudam de posição de acordo com o ângulo de visão. A solução é antiga e costuma funcionar, mas os problemas começam a aparecer no momento em que a ferramenta de zoom é utilizada.

Como a resolução da tela do DS é baixa, é normal que os sprites fiquem bastante pixelados conforme a câmera se afasta. E como é praticamente impossível jogar com a câmera próxima demais, o jogador fica fadado a ter que arcar com uma definição ruim dos sprites, de modo que a jogabilidade não seja prejudicada. Com o tempo você acaba acostumando, mas a impressão inicial certamente não é das melhores. A interação por meio da stylus também prejudica um pouco o sistema de combate já que é necessário clicar com exatidão em cima dos adversários para que um combate tenha início. Neste caso os sprites menores acabam dificultando o processo, o que é bem chato no início.

Por sorte a interface do game é bastante simplificada, de maneira que até três barras de atalho possam ser arrumadas, permitindo assim o rápido acesso à itens especiais e habilidades específicas. A execução de algumas habilidades também depende de alguns gestos simples com a stylus, mas não chega a ser algo preocupante ou extremamente complexo. Podemos dizer que, de modo geral, a interface é agradavelmente simples, permitindo assim o melhor uso dos recursos oferecidos pelo jogo e facilitando o combate em situações mais complexas.

A parte sonora também tem seus méritos. As músicas garantem a boa ambientação do jogo, sendo elas retiradas diretamente da versão online do game. A diferença é que elas são aplicadas em momentos específicos, ajudando na dramaticidade das cenas, sejam elas tristes, tensas ou apenas cômicas. Os efeitos sonoros seguem o mesmo princípio, sendo estes velhos conhecidos daqueles que já conferiram com exaustão a versão online do jogo. No final o conjunto até que agrada, apesar de não ter uma qualidade primorosa no fim das contas.

Matar, matar, matar, matar... até que o próprio jogador resolva morrer de tédio. Infelizmente, "Ragnarok DS" deixa muito a desejar no portátil da Nintendo. A intenção dos produtores de reproduzir a sensação de se jogar o game online, só que em uma história fechada e sem outros players interagindo foi nobre, mas não bem sucedida. O resultado é um título que te obriga a executar as mesmas ações inúmeras vezes, de forma incessante e chata. Se você é fã da versão online, pode até ser que goste. Mas se você apenas anda procurando um bom RPG no DS, então é melhor continuar sua busca.

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